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Governo vê ‘óbice jurídico’ e adia troca de presidente da Anvisa

A intenção do governo Bolsonaro de colocar o contra-almirante Antonio Barra Torres na presidência da Anvisa no lugar do ex-deputado federal William Dib esbarrou em “óbice jurídico”, segundo fonte do Planalto.

A dúvida é se há brecha para contestação nos tribunais ao retirar Dib do cargo antes de dezembro, quando acaba seu mandato de diretor da autarquia. A diretoria da Anvisa tem cinco membros, todos indicados pelo Planalto e sabatinados pelo Senado. A chefia da Anvisa é escolhida por decreto do presidente da República, que pinça um dos diretores do órgão para o cargo.


A leitura é nova. Informalmente, o governo avaliava a medida como regular e já dava como certa a substituição. A ideia de interferir no comando da agência ganhou força após junho, quando Dib, sem aval do governo, apresentou proposta de regulação do plantio de cannabis para produção de medicamentos e pesquisa. O ex-deputado é relator e principal defensor da medida.


Bolsonaro recebeu Barra Torres na segunda-feira, 19. A reunião fez subir as apostas na agência e indústria sobre a troca de presidente.


Segundo o porta-voz da Presidência da República, o general Otávio do Rêgo Barros, o assunto da reunião foi uso de produtos à base de cannabis. O presidente teria reforçado que que “é favorável ao uso deste produto (com canabidiol) para fins medicinais, mas não admite que brecha na legislação seja usada para plantio e consumo da maconha“, disse Rêgo Barros.


A campanha pela derrubada da pauta na Anvisa – e de Dib – foi encabeçada pelo ministro da Cidadania, Osmar Terra (MDB), que chegou a afirmar que o diretor da agência era líder de um movimento “pró-droga”. Em entrevista à BBC publicada no domingo, 18, Dib disse que Terra age por “motivações ideológicas e não científicas”.

A Anvisa é vista pelo governo como órgão estratégico. Além de medicamentos, a autarquia lida com agrotóxicos, alimentos, cosméticos, produtos para saúde (órteses e próteses) e faz o controle sanitário nas fronteiras, portos e aeroportos. Os diretores da agência estimam que mais de 20% do PIB nacional é regulado pelo órgão.


Fritura


Acusado pelo governo de trabalhar pela liberação das drogas, Dib era deputado conservador, do PSDB. Ele chegou a subscrever, junto do então deputado Jair Bolsonaro, polêmico projeto de lei para revogar regra sobre atendimento integral a vítimas de violência sexual, apresentado sob argumento de evitar a “legalização do aborto no Brasil”.


Dib virou diretor da Anvisa em 2016 e foi nomeado ao comando do órgão no final de 2018, na cota pessoal do ex-presidente Michel Temer (MDB). O ex-deputado correu por fora em disputa interna protagonizada pelos diretores Renato Porto e Fernando Mendes, apadrinhados respectivamente pelos ex-senadores Eunício Oliveira (MDB-CE) e Romero Jucá (MDB-RO).


No governo Bolsonaro, a fritura de Dib começou em janeiro. O presidente da Anvisa se desgastou após uma empresa acusar na Justiça a Anvisa de vazar documento sigiloso a sua concorrente direta. A autora da ação é representada pela advogada Rosângela Moro, esposa do ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro.


O governo já sinaliza com a derrubada de Dib desde que Torres foi nomeado à agência. “Por enquanto eu tenho ainda o direito de, se quiser, no mesmo dia colocá-lo (Barra Torres) como presidente da Anvisa”, disse Bolsonaro no começo de agosto, quando recebeu o militar pela primeira vez.


Na saída da primeira reunião com o presidente, Torres disse ao Estado que não foi convidado para assumir a chefia do órgão e que não tratou na reunião sobre cannabis. No entanto, o diretor afirmou que a decisão é “discricionária” de Bolsonaro. “Não sei o que o presidente fará amanhã”, declarou à época.


O Estado apurou que dirigentes da agência que votaram para a regra ir à consulta pública avaliam agora mudar de posição e pedir vista. Mas o prazo para devolver o processo é de duas reuniões. Em tese, portanto, haveria tempo de votar o tema ainda este ano. “A pressão não será apenas sobre o relator, mas de todos os diretores”, admitiu Dib. Ele não descarta que medidas sejam adotadas depois de uma eventual publicação da regra. “No Brasil, às vezes a gente se espanta com decisões sumárias, juridicamente corretas, mas nem sempre eticamente corretas.”



Fonte: O Estado de S. Paulo




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